sexta-feira, 22 de maio de 2009

Valsa

Pensei em não começar porque sabia que não tinha um fim para essa ideia. É um costume de escolher primeiro as últimas palavras. De saber terminar um texto antes de ter um esboço do início.
Mas talvez fosse tolo desperdiçar a sensação que trago agora, que talvez não me leve a dizer grande coisa. E, por fim, também não seria justo me negar o gosto de rememorar essa história quase sem sentido.
Sentada em uma arquibancada do colégio, de costas para a quadra e para o jogo de basquete do qual eu deveria estar participando. Tentava decorar um texto. Valsa n 6. Acho que era Valsa n 6. E duas meninas passaram atrás de mim e riram. Devia ser mesmo um tanto ridículo.
Tudo me surgiu, porém, como um misto de vergonha e orgulho. Uma prova de não ser uma igual. Um certificado de inaptidão para aquela vida, um salvo-conduto para a liberdade. Um traço infantil que teimo em sublinhar quase diariamente na minha maledicência, tantas vezes encenada, na minha intolerância, criada e reafirmada. Na minha indignação, um tanto falsa.

segunda-feira, 18 de maio de 2009

esperando o elevador

Há uma foto da Clarice logo na entrada do elevador. Quase de perfil, envolta em certa fumaça, uma névoa, uma luz branca que toma o fundo.
Ao longo do corredor, surgem umas tantas outras imagens. Do Nelson com um semblante de "não me fotografem", do Volpi andando por uma calçada mal-cuidada no Cambuci (será que o bairro é esse mesmo?), de tantos outros e de tantas outras coisas. Registros de enchentes e de copas do mundo. A primeira faixa de pedestres da cidade, ali no viaduto do Chá. Mas, fico sempre com o tal retrato da Clarice. Mesmo sendo em preto e branco, sempre imagino um batom vermelho, vermelhíssimo. E as mãos que não aparecem, é como se eu pudesse vê-las apoiadas sobre o colo, sobre as pernas cruzadas.

sexta-feira, 8 de maio de 2009

da histeria pessoal e intransferível

Perco-me em meio a tanta gente, tantas companhias. Porque sempre foi preciso uma dose de solidão, algum grau de confinamento e angústia para que eu me sentisse verdadeiramente acolhida.

terça-feira, 5 de maio de 2009

desordem

Descobri que venho aqui quando tenho algum outro texto para fazer. Quando preciso de palavras para contar alguma coisa e não sei ao certo por onde começar. E aí, talvez, começar a escrever bobagens seja um jeito de ir me acostumando.
Os dias seguem todos tão parecidos. As resoluções, as mudanças que decido colocar em prática no dia seguinte terminam sempre esquecidas, deixadas de lado. E antes de dormir eu torno a renovar minhas promessas: acordar mais cedo para ler antes de vir trabalhar, não deixar a louça se acumular em pilhas sem fim, colocar o espelho na parede.
Quando o chuveiro queimou ontem à noite, tive daqueles desesperos súbitos. Aquela vontade de sentar no chão e maldizer a vida. Porque estou só, porque o chuveiro falha quando preciso tanto de água quente para me sentir melhor, porque, em mim, tudo parece fora de lugar.