quarta-feira, 29 de julho de 2009

atendendo a pedidos

O poema porquinho da índia é uma das minhas antigas obsessões. Mas segue aqui transcrito para atender às súplicas do meu novo bichinho de estimação.

"Quando eu tinha seis anos
Ganhei um porquinho da índia.
Que dor de coração me dava
Porque o bichinho só queria estar debaixo do fogão!
Levava ele pra sala
Pra os lugares mais bonitos mais limpinhos
Ele não gostava: Queria era estar debaixo do fogão.
Não fazia caso nenhum das minhas ternurinhas . . .

— O meu porquinho da índia foi minha primeira namorada".

Manuel Bandeira.

sábado, 25 de julho de 2009

roubado do "morte ao superego"

Maria

Inside the house there was a woman
She was young and joyful and wore white dresses
She sang during the day while she did her chores
Her voice was beautiful
Nobody had ever seen her

She never ventured outside the house
If she wasn’t allowed to, or
If she didn’t want to
Nobody knew for sure

Her skin was white, her hair was deep black
Nobody ever saw
her

Some people say
She wandered in the night
The moonlight made her skin look even fairer

They say
She swam naked in the lake
And she talked to animals and trees

One day her voice could not be heard
One day, two days, three days, four days

Maybe she was killed, or
She killed herself
Maybe she drowned, or
A snake bit her

There was no music in the house
Her name was Maria
She wore white dresses only.


claralobo.blogspot.com

mudança

estou de mudança... o endereço ficará só correiomaratimba.blogspot.com

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Carnaval antigo ... Recife

Quem tem Antônio Maria não precisa de enciclopédias, de tratados de filosofia, de compêndios médicos ou sessões de psicanálise. Basta uma crônica breve.

No Carnaval, minhas calças eram brancas e meus sapatos de tênis. As camisas, sempre feias, variavam. Lembro-me de uma roxa, que desbotava.

No Recife, o Carnaval começava no Natal. Ou melhor, não havia Natal no Recife. A 24 de dezembro, os blocos saíam à rua, com suas orquestras de trinta a quarenta metais, seus coros de vozes sofridas, a tocar e a cantar as "jornadas" mais líricas. Chamavam-se "jornadas" alguns dos cantos carnavalescos do Recife, talvez por influência das "jornadas" dos pastoris. Agora, por que os cantos dos "pastoris" se chamavam jornadas, não sei.

Mas, na noite de 24 de dezembro, quando a gente pensava que seria uma noite silenciosa, o Vassourinhas estourava numa esquina, acordando-nos, na alma, uma alegria guerreira, impossível de explicar agora, tanto tempo e tanta fadiga são passados. Nós íamos, primeiro, às janelas, depois para a rua, até que afinal nos misturávamos ao povo, onde cada rei fantasiado, cada rainha de cetim, eram reis de verdade. Mas, reis de quê? De tudo. Da voluntariedade, do absolutismo, do amor e do futuro. O futuro de quem faziam parte.

Não se pode fazer ideia do que era o povo do Recife, solto nas ruas do Recife, após a declaração irreversível do Carnaval. Faziam parte da corte imperial mulheres morenas, que suavam, em bolinhas, na boca e no nariz. Mulheres de olhos ansiosos, presas de todos os atavismos de religião e de dor, a dançar a mais verdadeira de todas as danças _ o frevo. Ah, de nada serviam suas heranças de submissão, porque o despontar do Carnaval era um grito de alforria. E seus corpos, seus braços, seus pés, teriam sido repentinamente descobertos, assim que os clarins do Batutas de São José romperam o silêncio a que os humildes eram obrigados. Tão louca e tão bela, aquela dança! Uma verdade maior que as verdades ditas ou escritas saía dos seus quadris, até então bem-comportados.

Se fosse possível descrever, em palavras, a introdução, ao menos a introdução, da marcha do clube das Pás! Mas é possível dar uma ideia do que se passava por dentro de mim, que me sentia, inopinadamente, órfão e livre, desapegado de tudo e de todos. Eu era mais que um guerreiro. Era o vento. Cada homem e cada mulher era uma parte daquele furacão libertário. Todos se emancipavam (eu digo por mim) e se tornavam magnificamente dissolutos... porque o clarim estava tocando, porque os estandartes se equilibravam no espaço, porque o mundo, naquele exato e breve momento era, afinal, de todos.

Tudo deve estar mudado. O Carnaval do Recife talvez não seja, hoje, um desabafo. Talvez não contenha aquele desafio de homens e mulheres, livres de todas as sujeições e esquecidos de Deus. É possível que se tenha transformado numa festa, simplesmente. Talvez seja alegre e isto é sadio. Mas os meus carnavais eram revoltados. Não tenho a menor dúvida de que aquilo que fazia a beleza do carnaval pernambucano era revolta _ revolta e amor _ porque só de amor, e por amor, se cometem gestos de rebeldia.

Muitas vozes, de madrugada, o menino acordava com o clarim e as vozes de um bloco. Eles estavam voltando. O canto que eles entoavam se chamava "de regresso". Não sei de lembrança que me comova tão profundamente. Não sei de vontade igual a esta que estou sentindo, de ser o menino que acordava de madrugada, com as vozes de metais e as vozes humanas daquele Carnaval liricamente subversivo.

Meu quarto era de telha vã. Minhas calças, brancas. Meus sapatos, de tênis. Meu coração, inquieto. E nada tinha sido ainda explicado.

Antônio Maria, 7/2/1964

terça-feira, 21 de julho de 2009

tem, mas acabou

Amigos e problemas: não há vagas.

previsão do tempo

Pelo vidro fosco não é possível ver nada, mas dá para saber que faz sol. O que já é em si uma grande coisa. Pelo menos desde que dei para padecer dessa ansiedade nórdica pela luz e a vasculhar com método e devoção as previsões meteorológicas. Parece loucura, eu sei. Mas uma moça doidivanas precisa estar sempre atenta a novas idiossincrasias para manter o seu encanto e a sua reputação.

sábado, 18 de julho de 2009

por que maratimba?

Como era de costume, os Braga partiram para suas férias anuais em Marataízes. Rubem chegava do Rio, onde estudava direito na Universidade Federal. Aos 17, já escrevia editoriais furiosos, envolvia-se em querelas políticas, e contribuía regularmente com o “Correio do Sul”, jornal que a família fundara em Cachoeiro.
1930. Não era um ano fácil. Não era. Desde que os paulistas romperam com o pacto e indicaram Julio Prestes à presidência da República, o movimento oposicionista se intensificara. A quebra da Bolsa de Nova York em 1929, Getulio marchando em direção ao Rio de Janeiro, a deposição de Washington Luís.
Mas aquele era também um carnaval. “Taí” era a marchinha de sucesso. E Rubem era o melhor nadador da praia do Siri. Só queria falar da preguiça, do sol, das meninas, do vento. Seriam suas notas de verão. E resolveu juntá-las e publicá-las no tal “Correio do Sul” com o nome de “Correio Maratimba”.

quinta-feira, 16 de julho de 2009

mais mencken

O adultério é a democracia aplicada aos relacionamentos.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

santa izabel - parte 2

Foi pela avenida Ipiranga que o ônibus passou. As crianças penduradas às janelas, os gritos. Meu saudosismo flagrante mostra-me que envelheço mais depressa, sempre mais e mais.
O destino de nossa excursão anual era uma vila nas montanhas, bem perto de Domingos Martins. Ficava quase à beira da rodovia e era um povoado de uma rua só. Bem à entrada, estava uma grande casa de padres, na qual passaríamos o dia inteiro. Descíamos do ônibus direto para um pátio onde nos serviam o café da manhã. Uma bacia plástica com fatias de pão de forma. Vidros transparentes cheios de mel. Potes de margarina e garrafas térmicas com café e leite. No final da mesa, ficava uma panela grande de alumínio, cheia de canjica.
Depois, era hora de ir à capela. As paredes esverdeadas guardavam imagens dos santos e bancos envernizados de madeira. Quase ninguém gostava dessa hora. Mas a pequena devota que eu fui, ressentia-se das risadas e cochichos. Era a ansiedade incontida pelos banhos na piscina de cimento. O chão coberto de limo e a água gelada a não poder mais, que vinha de uma fonte no alto do morro.

terça-feira, 14 de julho de 2009

santa izabel - parte 1

Era difícil dormir. De vez em quando ia até a janela para ver se já havia amanhecido. Mas estava escuro ainda. E o remédio era continuar na cama até as 6h, fazendo um esforço, sempre inútil, para não pensar em nada e pegar no sono.
Na hora marcada, o ônibus estava no pátio. Pais plantados diante das janelas para se despedir. Mas eu sempre ia sozinha, então ficava olhando as mães alheias com sua infinidade de recomendações e acenos de mão. Todo ano, o caminho era o mesmo, o passeio até Santa Izabel era sempre o mesmo. E nisso estava a graça. As crianças falavam, gritavam e cantavam coisas tolas, que eu insistia em recriminar.
Entre resmungos, pedia para ir à janela e ficar vendo a subida da serra, as montanhas. Em um ponto da estrada havia uma fonte de água mineral. Famílias paravam os carros para encher suas garrafinhas. E eu ficava esperando a fonte aparecer. Sabia que logo depois da curva viria Vista Linda, um mirante no alto de um morro, cheio de chalés horrendos e umas poças de água que eles chamavam de lagos. Era feio, feiíssimo e eu adorava.

domingo, 12 de julho de 2009

mais mencken

Estou deslumbrada por esse homem. Trintonas separadas, consolai-vos.

Todo marido começa por beijar uma garota bonita _sua esposa_ e termina maquiavelicamente evitando beijar aquela com quem ele partilha diariamente as refeições, os livros, as toalhas de banho, a carteira, os parentes, as ambições, os segredos, as doenças e os negócios _um procedimento tão romântico quanto mandar que lhe engraxem os sapatos. Nem mesmo o inato sentimentalismo do homem consegue superar o desgosto e a chatice disso tudo. E nem mesmo a capacidade histriônica da mulher pode ver nisso sombra de volúpia ou espontaneidade.

sábado, 11 de julho de 2009

depois do 7 do 7

Logo depois da peça da Fernanda, regressei a Sartre e Beauvoir para abandoná-los novamente semanas depois. Há alguns dias, porém, retomei a biografia deles _a biografia da relação dos dois que andava lendo. Terminei hoje pela manhã. Com chuva, frio, cobertores e chá de capim cidreira. E encontrei uma frase que gostaria de ter escrito na sua carta de aniversário.

Uma coisa não mudou e não pode mudar_ não importa o que aconteça e o que eu venha a ser, virei a ser o que eu for com você.

sexta-feira, 10 de julho de 2009

da chuva e suas revelações

Uma tarde chuvosa pode ser uma incrível fonte de descobertas. Entre as novidades da livraria, encontrei o incrível "livro dos insultos", do incrível H. L. Mencken. Um sujeito mau e desagradável. Absolutamente adorável.



De fato é melhor dar que receber. Por exemplo_ presentes de casamento.



Quanto mais envelheço, mais desconfio da velha máxima de que a idade traz a sabedoria.



Pode ser um pecado pensar mal dos outros, mas raramente será um engano.



É muito difícil acreditar que um homem esteja dizendo a verdade quando você sabe muito bem que mentiria se estivesse no lugar dele.

quinta-feira, 9 de julho de 2009

persuasão

Mais um feriado na Barão de Limeira. Saldo negativo no banco, aquelas velhas querelas. Mas quem se importa?
Café com jornal na padaria, Ray Charles na vitrola, sol (!). Para completar minha felicidade frouxa, descubro que a árvore diante da janela não perdeu uma folha sequer desde o começo do inverno. Ah, e estreio o meu novo vestido de bolinhas.

terça-feira, 7 de julho de 2009

muitos anos de vida...

Tanto tempo e ainda não me acostumei com os aniversários. É sempre aquela falta de jeito, um certo acanhamento, um medo de ter que repetir palavras que não significam nada. São elucubrações adolescentes e tolas, eu sei. Qual o grande problema afinal de dizer "feliz aniversário"?
Mas o fato é que sou incapaz. Confesso. Eu tento, ensaio diante do espelho... mas essa história de parabéns soa inevitavelmente ridícula na minha boca. Tem gente que não revela a idade. Há quem não consiga fazer declarações de amor. Esta pobre escriba proletária tem fobia absoluta das frases feitas da tal data querida.
Em abril liguei para o Chico. Falamos da vida, da idade, do tempo. Fizemos pilhéria da velhice. E desligamos sem as palavras fatídicas. Sei que ele entendeu. Sei que ele também não consegue. Alguma incapacidade herdada geneticamente.
De qualquer maneira, hoje à noite (no meu aniversário preferido entre todos os aniversários) irei recriminar os convivas silenciosamente durante os festejos. Porque essa gente não aprende que é "parabéns a você" e não "para você". E também não tem essa história de muitas felicidades... É no singular. Porque uma só já é bem difícil arrumar.

domingo, 5 de julho de 2009

segunda-feira ao sol

E eu precisava do cinza para compor a paisagem.
Vesti a roupa escolhida na véspera. Levantei depois de horas sem dormir, depois de tranquilizantes, cartas sem sentido e canções que me fizessem chorar. Pensei em flores, em margaridas. No vestido que usava quando passeamos na praça. Devaneios com mármores, com escadarias funestas, com véus. E a certeza da tempestade lá fora, da água, do assovio do vento.
Mas, aberta a cortina, revelou-se um mar esverdeado. Seguro de sua beleza, intacto. Pessoas caminhavam ao sol. Inconvenientes. Um dia inteiro que despertara alheio, e me abandonava ainda mais só com meu espanto.

aqueles dois

Não somos bons de despedidas
Passeamos lado a lado, os ombros tocando-se.
Já está começando a escurecer.
Estás pensativo, eu não digo nada.

Entramos nesta igreja para ver
alguém está sendo enterrado, batizado, se casando,
depois vamos embora, sem olhar um para o outro.
Por que é que para nós nada dá certo?

Vamos sentar na neve pisoteada
do cemitério, suspirando de leve.
Com a ponta da bengala, traçarás palácios
em que viveremos felizes para sempre

Anna Akhmátova
São Petersburgo, 1917

quinta-feira, 2 de julho de 2009

delírio da escriba proletária

Previsão de chuva. E só consigo pensar na folga de amanhã. Frio, cobertor, filme, brigadeiro. Exatamente nessa ordem.

quarta-feira, 1 de julho de 2009

mentiras cor de rosa

E a bobagem escrita ontem achei em um caderno velho. 2000. Qual era o braço? E que segredos teria eu agora a partir? Coloquei aqui para ver se faria algum sentido repetir palavras velhas. Se seria ainda capaz de suor e taquicardia. A minha febre é morna.