Ninguém devia tentar escrever se não tem nada a dizer... a não ser quem é pago para isso e não pode esperar pela conveniência da inspiração. É por isso que as crônicas ainda e sempre são capazes de me despertar tanto assombro. Porque têm hora e dia marcado para serem escritas. Porque surgem ali naquele espaço pré-determinado e fixo, com aquelas letrinhas contadas. Porque carregam essa aura de milagre, de escape da miséria diária de quem tem que escrever sem razão e sem vontade. Na mudança da Barão de Limeira para o Limão deixei os volumes de crônicas em casa... ficam aqui apenas os alfarrábios e tratados de artes cênicas. Aqueles compêndios modorrentos sobre a formação do ator, aqueles textos enfadonhos de novos e velhos dramaturgos.
É verdade que me sinto um pouco órfã sem o livrinho amarelado do Bandeira. E penso em trazer os pequenos volumes e espalhá-los pela mesa branca e triste de escritório. Colocá-los ao lado dos elefantinhos de madeira, da caixinha de papel em forma de coração, de todas essas quinquilharias que deixo por perto para me dar a impressão de que estou em casa, de que não sou estrangeira, de que estou fazendo o melhor que posso. O que é mentira. Mas, ao cabo, é preciso acreditar em alguma coisa. E trabalhar, talvez, para reinventar a criança que fui um dia. E honrá-la em alguma medida.
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