segunda-feira, 13 de setembro de 2010

da arte de perder

"Temos dificuldade de compreender o significado verdadeiro dos atos e relações humanas. Por exemplo, alguém morre e você não entende. Ele foi enterrado e você
continua não sentindo nada. Perante o mundo você veste luto, olha para a
frente em público com uma seriedade solene, mas depois, em casa, só, você
boceja, coça o nariz, lê um livro, pensa mais em tudo e em todos do que no morto, por quem você veste luto. Você vive aparentemente em determinada condição, sombrio e enlutado, e por dentro você percebe surpreso que não sente nada, a não ser um alívio e uma satisfação culposa. E indiferença. Uma profunda indiferença. Isso dura algum tempo, dias, talvez meses. Você engana o mundo, vive numa manhosa indiferença. Depois um dia, muito mais tarde, passado os anos, quando o nariz do morto já caiu, você caminha na rua e fica tonto, se apóia no muro, porque compreende. O quê? O sentimento que o liga ao morto. O significado da morte. O fato, a realidade, a inutilidade de escavar com as unhas na terra tudo o que restou dele, você nunca mais poderá ver seu sorriso, e toda a sabedoria e poder do mundo são impotentes para que
ele, o morto, venha na sua direção na rua e sorria para você. Você pode
ocupar todas as regiões da Terra com um exército, nada vai ajudar. Então você
grita. Ou nem isso, apenas fica parado na rua, pálido, e sente um
vazio, como se o sentido do mundo se extinguisse, como se você tivesse
ficado só no mundo."

Sándor Marái

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